Quero colorir esta Lisboa

Esta noite, Lisboa adormeceu chuvosa.
Mas quem a ama, sabe gostar dessas suas lágrimas que a lavam e rejuvenescem...


Quero colorir esta Lisboa

Quero colorir-te, Lisboa.
Expressar no papel as impressões
dos verdes, dos rosas, dos ocres.
E dos azuis também.

Quero rasgar-te de Luz
beijar-te de Rio
e amar-te despida
em cada manhã de sábado.

Percorro-te as entranhas de escadas
e escadinhas muito tímidas.
Perscruto-te a alma
de cada água-furtada aberta sobre a Vida.

As minhas mãos querem acariciar o teu corpo quente.
No entanto, estás fria, enrugada, velha e gasta.
Caem-te os cabelos,
curvam-se-te as costas,
choram-se-te as portas enferrujadas.

De ti, prostituta de rosto sofrido,
queria ser teu cirurgião:
fazer-te um lift ou outro que tal,
recuperar-te a fronte
e elevar-te o sorriso
- com franqueza! até uma prostituta deve ser bela!

E tu és o fogo que me alimenta a alma.
Acalmas-me o espírito em lojinhas de bairro.
Desejas-me bons dias em gatos vadios
ou lambes-me as lágrimas com teus raios de Sol.

E só quero pegar na paleta,
descer pr'á Rua do Mundo,
pintar horizontes iluminados,
becos afogueados,
jardins semi-abandonados
e até casais de pombos e de namorados.

Ofereces-me, qual odor valoroso,
um cheiro ténue de manhãs de esperança.
É subtil e doce, tal aroma,
e tem a cor de um beijo roubado
a uma menina púbere.

(c) Dulce Dias – 1997-11-29

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