Odores e sabores

Hoje colhi a primeira salsa da minha floreira. Que odor e que sabor! Aquilo que dantes era uma coisa natural, tornou-se agora um prazer raro e incomensurável: colher salsa fresca para a comer logo de seguida.

Salsa

Criada entre o campo e a cidade - que sorte! -, quando era menina, ia com a minha avó colher os frutos e legumes pela manhãzinha, quando ainda estão frescos. O pomar e a horta libertavam aromas inebriantes e puros. Na altura, a terra era terra e o único fertilizante era o estrume feito na estrumeira com os resíduos orgânicos do dia a dia. E em cada nova manhã, lá ia eu, gaiata, atrás da avó, colher os alimentos do dia. A vida era saudável.

Aqui, na cidade, nada tem cheiro, nada tem sabor. Mesmo num passeio pelo mercado, ao domingo de manhã, à beira Saône, embora o olhar se deleite com as cores, não encontro cheiros. As laranjas estão parafinadas. As maçãs, vindas de Israel, são calibradas. E os tomates são apenas bonitos de ver. E a salsa, ai a pobre salsa, nunca cheira a nada!

Cansei-me deste mundo sem odores. Por isso, as sementinhas na bagagem do avião, e aí estou eu, armada em nova agricultora, a semeá-las numa floreira, pendurada na janela da cozinha deste sexto andar de Lyon. A terra já não é exactamente terra, mas daquelas coisas ensacadas, que se compram nas grandes superfícies, mas enfim... é o possível. Demorou tempo, o tempo que a Natureza precisa de demorar para ser natural, mas a salsa medrou. E hoje colhi o primeiro raminho!



Há muito tempo que a meia-desfeita de bacalhau com grão não me sabia tão bem!

(c) Dulce Dias - Crónicas Leonesas - 2004-07-15

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